terça-feira, 20 de outubro de 2009

Olhos Profanos

"That is not dead which can eternal lie
And with strange aeons even death may die"
- H. P. Lovecraft




Contemplo o mundo em excesso de existência. Nada, simples como uma cor, contém a si mesmo e é completo. As cores parasitam umas às outras, de forma que nunca contemplo o céu livre de suas infecções em padrões psicodélicos. Pulsando, piscando, morrendo e matando em velocidade monocromática. Um espetáculo indescritível de luzes fantasmas que coexistem com o abismo negro de minhas pálpebras. Algum desarranjo das células cônicas, talvez um sintoma de catarata prematura. Química anômala induzida por substâncias invasoras e corrosivas que alteram a percepção do mundo. Tudo isto interpretado pela lógica das idéias quiméricas, as quais este insone onirismo me inflinge, e assim infectado de pesadelos terríveis e fractais etéreas infinitas. Desafiam as leis da natureza e se tornam um risco à razão. Linhas sem fim, voláteis: deslizam fritando em minha mente e a imagem é uma mera ilusão. Pode um homem confiar nestes olhos profanos? Como no conto, o homem contempla a beatitude do sol e não podendo suportar tal intensidade luminosa, é cegado pelo esplendor da existência completa. Mas ele luta, esforça-se e supera a cegueira inicial, alçando sua consciência a uma nova interpretação, mais perfeita, evidente e restrita, mas profundamente rica. A visão panorâmica da paisagem sob as luzes policromáticas e aparentemente vivas revela o lado que apesar de recheado com ilusões psicodélicas extasiantes é em si verdadeira mente sombrio. Escuro como noites de assassinato, lá está o abismo presente e constante na mente inebriada do romântico comedor de ópio. Delírios febris paranóicos e bruxuleantes açoitam a consciência fragmentada com medos irracionais e abstrações incognoscíveis. Mitologia lisérgica pagã vive e pulsa soberana dividindo a consciência em principados autocráticos. A destruição que traz a devastação completa da sanidade acontece acompanhada da marcha triunfal de um eu interior e alienígena que se rebelou contra o ego. Anjo caído que abandona o paraíso perdido da razão. O arquiteto cai, morto. Ourreason decadente, se suicida impotente e expele os fluídos da podridão pelos buracos e feridas de seu corpo imaculado. Sangue e merda alimentam as quimeras que violentam e queimam a minha consciência. O Universo incabível infinito e limitado dentro do meu crânio entrou em colapso. Buracos negros supermassivos, assassinos da existência, engolem vorazmente as lembranças e os sentimentos, o estado fundamental é dilacerado. A Queda é sutilmente assimilada e meu espírito se desfaz no éter. Restam estes olhos profanos que ornamentam a mortalha tísica como rubis fleumáticos sem brilho. Injetados de sangue, por trás de lentes escuras, eles continuam a observar silenciosamente. Enviam, pateticamente, as imagens distorcidas de um mundo vil para este vácuo onde nada pode existir. Uma estátua vazia, sem espírito e sem razão, que já viveu um dia.



"E Fuzon convocou então
Os filhos restantes de Urizen
E a terra oscilante abandonaram
Denominaram-na Egito & se foram.

E vastas Vagas salgadas o globo envolveu."
- William Blake (O Livro de Urizen, 1794)


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